De volta às pistas 16 anos depois
Foram necessárias quase duas décadas de distância para que o editor do Push to Cast sentisse o prazer de andar de kart rental novamente
Dezesseis anos, sete meses e oito dias. Este é o tempo que separa 29 de março de 2008, a última vez que havia pilotado um kart e 10 de novembro de 2024, quando acabei com esse longo hiato longe de uma das atividades que mais gosto de fazer: pilotar.
Foram necessários 6.070 dias para que pudesse me reencontrar com esse pequeno monoposto de motor estacionário quatro tempos, envolto em uma proteção de borracha reforçada, a 218 quilômetros longe do Circuito Internacional Techspeed – então chamado de Kartódromo do Velopark, em Nova Santa Rita (RS), pais precisamente no Kartódromo Dante Roveda, em Vacaria, região Nordeste do Estado.
Não foi por acaso.
Desde o fim do ano passado, quando cobri a final do Campeonato Gaúcho de Kart em Venâncio Aires, no Vale do Rio Pardo, meus laços com o kartismo profissional se estreitaram. Foi lá que conheci Jean Picolotto, então gestor do Serra Kart Racing (SKR), competição de kart rental que usava as dependências do Kartódromo César Francischini, em Farroupilha, na Serra gaúcha.
Ele me apresentou a um ícone da modalidade: Cesar Mittag, preparador de motores de kart dois tempos, criador da Mittag Motores, chefe da equipe Mittag Racing e proprietário da ProKart Indoor. Conversamos bastante sobre kart, automobilismo virtual, e outras coisas além do esporte a motor.
Chegou 2024, o Push to Cast mudou seu foco para a cobertura do kart próprio nacional, especialmente estadual, e, com isso, veio o reconhecimento que, 8.741.460 entre o distante 29 de março de 2008 e o recente 10 de novembro de 2024, motivou a escrita deste texto.
Pois, só quem sabe como é ficar tanto tempo sem poder fazer aquilo que ama entende o que relatarei a seguir.
Como tudo começou
Durante o trajeto entre Caxias do Sul, na Serra Gaúcha, até Vacaria, eu e Tiago Zingali, pai do piloto Theo Zingali, conversávamos sobre automobilismo. O papo era sobre patrocínio, mas vale para tudo: para conseguir algumas coisas, além da competência, a gente precisa ter bons relacionamentos.
Só que eles não acontecem em um estalar de dedos. Leva tempo. É necessário conquistar a confiança, que deve ser mútua. E o trabalho sério que o Push to Cast fez nesta temporada sobre kartismo gaúcho, desde a cobertura das etapas até reportagens especiais, surtiu este efeito.
Não que o foco fosse receber algum prêmio. O automobilismo é a minha paixão e o jornalismo é a minha profissão. Então, é claro que eu sempre me dedicarei ao máximo possível para fortalecer esse esporte, mas também tenho de mostrar que o Push to Cast não é um hobby: é um trabalho, como outro qualquer. E, como tal, a valorização é necessária.
E foi isso que Mittag, Picolotto, Zingali, Júlio Pires e Guilherme Corso (estes dois últimos, também pilotos) viram ao longo desta temporada. Juntos, levaram o canal até Farroupilha para cobrir a final do Campeonato Gaúcho de Kart. Depois, entre conversas aqui e ali, convidaram este repórter para dar algumas voltas de kart e reviver aquilo que sempre esteve guardado: o amor por este esporte.
Aqui, vale um parêntese: outras pessoas também foram importantes nessa jornada, como Tiago Milioli, gestor da CKA Championship; Rafael Fronza, pai do piloto Joaquim Fronza; e Eduardo Giuriolo Rech e Fernando Barboza, membros da Associação de Automobilismo de Vacaria (AAVA).
Todos, de alguma forma, contribuem para que o trabalho do Push to Cast siga em frente da melhor forma possível.
Um pouco sobre o ProKart Indoor
Ao longo de muitos anos, Cesar Mittag e sua empresa administraram o Kartódromo Municipal de Farroupilha. Encerrada a concessão, poderia se desfazer dos karts rental que dispunha, mas decidiu que não seria uma boa ideia. Resolveu inovar.
Transformou o ProKart Indoor em um projeto itinerante, chegando aonde há público que busca velocidade a baixo custo, mas não encontra. Um desses locais é Vacaria, onde vai praticamente todo o fim de semana realizar algumas baterias.
Além disso, a presença de Mittag impõe respeito. “Aqui não é carrinho de bate-bate”, informa no briefing. Ou seja: venham competir, mas, principalmente, se divertir. E, tudo isso, de um jeito carismático, brincalhão, sem deixar a seriedade de fora.
Com essas regras, fica fácil ter uma corrida saudável. Há trocas intensas de posição e alguns esbarrões involuntários aqui e ali, mas nada de usar o “borrachão” para empurrar o coleguinha para a sujeira e, assim, conseguir a ultrapassagem.
São pequenos detalhes que fazem toda a diferença em quem busca lazer e segurança. Porque, no final, todos querem fazer aquela resenha e ter histórias para contar nos próximos encontros.
Gostei de ter coach, quem diria?
Sempre tive um pé atrás com coach de competição. Acredito que, muitas vezes, a gente precisa descobrir as coisas sozinho. Lógico, uma dica aqui e ali, tudo bem. Mas ter alguém te dizendo o que, como e quando fazer? “Não. Isso nunca!”, era o que falava.
Entretanto, existem momentos que uma ajuda mais direta é importante. Ainda mais quando se passa quase 17 anos sem chegar e acelerar.
“Tem jeito, mas ainda tem muito a melhorar”, me disse Cesar Mittag ao sair da minha primeira “bateria de testes”. Jean Picolotto pilotou comigo e deu algumas dicas (todas gestuais), mas que não soube aproveitar. Por uma série de motivos, como a dificuldade em aplicar aquilo que sabia na teoria.
Com isso, após acompanhar o meu traçado e minha média de tempos, Picolotto me chamou para dar uma volta na pista – o famoso “track walk”. A cada curva, me dizia não apenas como fazer para obter o melhor tempo: explicava o por quê daquilo tudo.
Pequenos detalhes que fizeram uma grande diferença. Minha volta mais rápida antes da aula, era de 1:03,8 segundos. Depois, caiu para 59 segundos alto – “apenas” dois segundos mais lento que o vencedor da bateria, que compete há anos.
É! Parece que levo mesmo jeito.
Não fui ultrapassado por ninguém: uma pequena vitória
O Kartódromo Dante Roveda tem 1.070 metros de extensão. A bateria que corri foi composta por oito pilotos, dividida em cinco minutos de classificação e mais 25 minutos de prova. Como já esperado, minha classificatória foi digna de um piloto da Sauber na Fórmula 1: último colocado.
Na largada, vi os adversários se distanciarem a cada volta. Em poucos minutos, eu já estava praticamente sozinho na pista. Quando olhava à frente, não via ninguém. O mesmo ocorria ao olhar para trás.
Nada que me fizesse ficar chateado. Para quem havia ficado mais de 16 anos sem acelerar, só queria me divertir e, claro, experimentar um pouco mais. Tive alguns sustos, mas não rodei.
Porém, nos últimos minutos, a mente parecia aquelas crianças em viagem longa. “Falta muito?”; “Já acabou?”; “Tô com fome”; e por aí vai. Mas, em nenhum momento, pensei em desistir – o que se mostrou um acerto.
Porque, ao final dos 25 minutos de prova, Júlio Pires teve de abandonar. Com isso, além de não tomar volta dos líderes, também “fiz uma ultrapassagem” – para mim foi isso que aconteceu e ninguém me tira isso.
Faria tudo de novo
Sair de Porto Alegre para ir a Vacaria, para muitos, pode ser uma loucura. Afinal, existem lugares que oferecem esse tipo de experiência aqui na Região Metropolitana da capital – onde moro –, tanto em ambiente fechado quanto em aberto.
Mas, sempre tem algo que nos faz tomar decisões um tanto “estranhas” para alguns. No meu caso, foi o fato de encontrar uma turma que não queria “mais um” para formar grid. Todos ali, de alguma forma, queriam se divertir e ver eu me divertir.
A maioria sabia sobre a minha paixão pelo esporte e a vontade de ser piloto, algo que as condições financeiras nunca permitiram. Porém, aos poucos, a gente encontra um lugar ao sol.
Como diz Cesar Mittag: “Tu é de casa”. E isso é o que vale.