Pró-Esporte RS: três projetos de automobilismo contemplados em 2024
Número é inferior a 4% dos 80 projetos da modalidade inscritos no programa e gera dúvidas em pais e pilotos. Diretor do setor responsável explica critérios de seleção
O esporte a motor é caro. Todos que decidem acelerar no asfalto ou na terra sabem. Mas, isso não é para todos: muitos desistem do sonho de ser piloto profissional muito antes de começar, justamente pela falta de recursos mínimos para arcar com os custos básicos da modalidade.
Não tem como ser diferente. Faz parte da natureza do esporte. Ao contrário do futebol, basquete, vôlei ou outros esportes coletivos, os equipamentos básicos para começar os trabalhos exige um alto grau de investimento.
Por exemplo, um kart novo para um piloto adulto não sai por menos de R$ 20 mil. Um usado – e decente – não sai por menos de R$ 10.000,00. Sem contar os custos com jogos de pneus, motor, local para alocar o kart e reserva de pista para treinar.
Tudo isso para falar de treino.
Porque, quando o assunto é competir, a situação fica muito mais complicada.
Só com a Cédula Desportiva Nacional (CDN) – que dá direito a competir em provas homologadas pela Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA) e federações – é necessário investir R$ 626,00 ou R$ 926,00 neste ano, dependendo da categoria.
E para competir?
Vamos pegar como exemplo o Campeonato Gaúcho de Kart, que neste 2024 terá quatro etapas. Um piloto que queira competir na F4 Light terá que arcar com, no mínimo:
- Inscrição: R$ 450,00 (antecipada)
- Aluguel de motor: R$ 550,00
- Jogo de pneus novos: cerca de R$ 1.000,00
Ou seja: por baixo, lá se vão, pelo menos, R$ 2.000,00 por etapa. Fora os demais custos, como preparador de motor, combustível, peças sobressalentes, capacete, vestuário, deslocamento, estadia, alimentação, e por aí vai.
Viu como não é fácil?
Por isso, muitos pais e pilotos buscam outras formas de financiamento das próprias carreiras. E a principal forma tem sido por meio das Leis de Incentivo ao Esporte (LIEs).
Leis de Incentivo ao Esporte: uma mão na roda
Como falamos nesta coluna, conhecer a legislação é fundamental para quem quer se profissionalizar no automobilismo. Entretanto, sabemos que as LIEs são as mais procuradas, pois servem como um “facilitador” para a atração de patrocínios.
Uma das mais buscadas é a do Governo Federal.
Sua última alteração, feita em 2022, permite que pessoas jurídica abatam até 2% do imposto devido para destinação do recurso a patrocínios esportivos. Já pessoas físicas podem deduzir até 7% na Declaração de Ajuste Anual.
Mas, a proposta federal não é uma regra absoluta.
Cada Unidade da Federação e município pode elaborar a sua sistemática. E, no Rio Grande do Sul, a legislação estadual, chamada Pró-Esporte RS, funciona de uma forma um pouco diferente.
O Pró-Esporte RS
Vinculado à Secretaria do Esporte e Lazer (SEL), o Pró-Esporte RS promove a aplicação de recursos financeiros a projetos de fomento às práticas desportivas e paradesportivas, sem distinção de modalidade, por meio de benefício fiscal.
O programa é dividido em dois mecanismos de fomento: a Lei de Incentivo e o Fundo Estadual de Incentivo ao Esporte (Fundo Pró-Esporte RS), ambos por meio de incentivo do ICMS a recolher.
No primeiro caso, parte investimento é com aportes diretos a projetos aprovados para captação de recursos. Já no seguinte, os empresários podem depositar os valores direto ao Fundo Pró-Esporte RS. O montante será recolhido será usado para projetos esportivos selecionados por meio de editais.
E é neste segundo que muitos têm buscado seus financiamentos.
Menos de 5% de projetos contemplados
Esta reportagem foi incentivada após conversar com pais e pilotos sobre as dificuldades de terem seus projetos aceitos no Pró-Esporte RS. Para entender melhor a situação, o Push to Cast buscou as informações diretamente na fonte, por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI).
Conforme repassado à reportagem, o Pró-Esporte RS recebeu 80 projetos na modalidade esportiva “Automobilismo”. Eles foram inscritos no lote 2023-002, entre 1º e 31 de julho do ano passado, para execução de 1º de janeiro a 30 de junho de 2024, e o valor total solicitado foi de R$ 17.639.593,24, sendo R$ 13.169.598,95 como valor total da LIE.
Do total de propostas, 17 (21,25%) tiveram nota superior a 70 na Câmara Técnica – mínimo para aprovação –, mas apenas 3 (3,75%) foram efetivamente contemplados, recebendo R$ 526.047,80 (3,99% do total da LIE).
Quanto aos projetos reprovados, os motivos foram:
- Não atenderam condições técnicas básicas: 5
- Não atenderam condições técnicas básicas no prazo: 5
- Projetos desclassificados (nota inferior a 70 pontos): 53
- Total: 63 (78,75%)
Este resultado gerou rumores nos kartódromos e autódromos gaúchos de que o governo estadual não “daria valor” ao esporte a motor.
Como funciona a seleção
“Não teve nenhum projeto aprovado para kart, né?”, questionou o pai de um piloto que compete nas categorias profissionais de kart. O questionamento tem sentido: ele foi um dos 14 projetos não contemplados por falta de verba.
Já o pai de outro piloto, que queria competir na Super Turismo, ficou entre os projetos reprovados. “A frustração é total”, desabafa. “A gente paga por um projeto, cria toda uma expectativa, faz todo um planejamento – porque esse dinheiro que você investe no projeto poderia ser investido em treinos ou equipamentos -, mas é algo que se perdeu.”
Ambos aceitaram conversar com a reportagem sob a condição de anonimato.
O diretor do Departamento de Fomento da SEL, Paulo Cesar Verardi, esclarece o funcionamento do programa. “As verbas são distribuídas por Linha de Financiamento, proporcionalmente aos valores pleiteados em cada uma dessas linhas, com pequenos ajustes em função das políticas públicas vigentes”, explica.
Verardi acrescenta que a avaliação do mérito e qualidade dos projetos é realizado por um órgão independente da Secretaria do Esporte e Lazer. Ele é composto por nove entidades representativas, a fim de garantir lisura, equilíbrio e justiça na contemplação.
“As decisões tomadas pela Câmara Técnica são baseadas nos critérios disponíveis no Anexo I do Regimento Interno, disponível no site do Pró-Esporte RS”, ressalta o diretor.
Os critérios do Pró-Esporte RS
- Aderência do projeto aos objetivos do Pró-Esporte RS
- Ações efetivas de sustentabilidade econômica, social e ambiental
- Mecanismos de comunicação e divulgação
- Contribuição para formação de competitividade, integração ao Sistema Nacional do Desporto (quando aplicável)
- Alinhamento com a comunidade e efetividade para inclusão social e/ou formação educacional
- Relevância, foco, substância do projeto e incentivo para a prática esportivas
- Originalidade do projeto (descritiva, conteúdo, detalhamento) com relação a projetos similares e ao longo do tempo (quando aplicável)
- Grau de independência do projeto em relação ao Pró-Esporte RS, considerando as características da Linha de Financiamento, modalidade esportiva, alcance social e reduções ao longo do tempo (quando aplicável)
- Relação custo-benefício. Compatibilidade dos custos com os preços de mercado e retorno do investimento do Estado.
- Fundamentos e planejamento da operação de exiquibilidade, suficiência técnica e viabilidade econômica.
Para ler o Regimento Interno, clique aqui.
Cerca de 60 modalidades esportivas atendidas
Verardi salienta que, atualmente, o governo estadual trabalha com cerca de 60 modalidades esportivas dentre os projetos em execução. Uma das maneiras de saber quais são é pelo Diário Oficial do Estado (DOE).
Por meio da busca pela palavra-chave “Pro Esporte”, encontramos oito atos administrativos, que informam aspropostas aprovadas e os seus respectivos valores.
Entre os contemplados para automobilismo estão:
- R$ 149.640,00 para o projeto “Nas Pistas Gaúchas – Turismo 1.4 RS 2024”, da Associação Desportiva Portoalegrense (ADESP);
- R$ 288.964,80 para o “Aparados Off Road 2024”, da Associação Gaúcha de Pilotos e Navegadores de Rally.
Como ter sucesso no Pró-Esporte RS?
Não existe uma “fórmula mágica”. Mas, o diretor do Departamento de Fomento da SEL, Paulo Cesar Verardi, dá uma dica: “Buscar diferenciação, mais economicidade e, sobretudo, mais aderência ao espírito da Legislação.”
E o que seria isso? “Significa atender suficientemente a maioria dos principais objetivos traçados na lei”, explica.
Isso porque, informa Verardi, há uma enorme demanda existente. “Frise-se que essa recomendação é válida para todos os proponentes e projetos terem sucesso, independente da modalidade esportiva ou linha de financiamento”, conclui.