Academias de pilotos: oportunidade para desenvolver carreiras

Foto: Duda Bairros
Consolidar uma carreira no automobilismo não é uma tarefa fácil. Nem sempre o dinheiro será o suficiente para mostrar o potencial de um piloto. Às vezes, o que falta saber como e onde aplicá-lo. Em outros casos, a lacuna está no aprimoramento de habilidades que vão além da pista. Nessas horas, uma academia de pilotos pode ser uma verdadeira ‘mão na roda’.
Realizar o sonho de ser um piloto profissional vai além da habilidade. É necessário ter recursos suficientes, aplicá-los com racionalidade, estar nas competições e equipes certas e, ainda, acertar o timing para ser visto por quem pode investir em suas carreiras. Uma tarefa difícil só de imaginar; muito mais de colocar em prática.
Mas, como diz o ditado, “exite uma luz no fim do túnel”. Quando olhamos para alguns países, principalmente na Europa, notamos que muitos talentos que hoje estão nas principais categorias do mundo (não apenas monopostos), tiveram um auxílio tão importante quanto o dinheiro de familiares, amigos e patrocinadores e das instruções de coaches: uma academia de pilotos consolidada.
“As academias de pilotos não são novidade fora do país, principalmente no caminho para a Fórmula 1”, argumenta Ricardo Fávaro, CEO da Agência Motorbiz, uma empresa que atua na gestão de carreira, de imagem e de marketing para pilotos desde 2008. Entre seus clientes, estão Diego Ramos e Gaetano di Mauro – o primeiro, com carreira no kartismo internacional; o segundo, na BRB Stock Car Pro Series.
“A partir do kart europeu, existem muitas iniciativas, muitas academias – que muitas equipes de Fórmula 1 têm – e existem algumas independentes”, continua o empresário. Red Bull Racing, Mercedes, Aston Martin, Williams, Ferrari… praticamente todas do grid têm o seu programa de desenvolvimento de pilotos.
As que não criaram algum as suas, ficam de olho nas independentes, como a Minardi Management, gerenciada por Giovanni Minardi – qualquer relação com a extinta Minardi não é mera coincidência.
E, quando se fala em automobilismo, grande parte dos jovens kartistas tem a vontade de ganhar a vida por meio do esporte. Alguns desejam a Fórmula 1, outros a Fórmula Indy, e têm os que preferem competir “em casa” – seja na Stock Car, na Império Endurance Brasil, Copa Truck ou até mesmo continuando no kart.
Porém, surge aquela dúvida: como fazer tudo isso dar certo? As possibilidades são diversas, e uma delas pode ser por meio de academias de desenvolvimento de pilotos aqui em nossas terras.
Expertise existe
Era maio de 2024 quando uma notícia movimentou o esporte a motor nacional. Naquele dia 18, o Banco BRB anunciou a criação de uma academia focada em competições nacionais, em parceria com a Alpine Academy (que atua na Fórmula 1 e em campeonatos de Endurance).
De lá para cá, a exposição da marca da instituição – uma sociedade de economia mista com o governo do Distrito Federal como acionista majoritário – aumentou e está presente em diversas competições, como no apoio ao kartismo, passando naming rights dosTCR Brasil e South America, da Fórmula 4 Brasil e da própria Stock Car Pro Series, até chegar a patrocínios pessoais a competidores em diversas categorias.
Esta é uma forma de desenvolver os pilotos. Entretanto, Fávaro lembra que iniciativas assim não são inéditas. “Existiam algumas iniciativas no passado, com bastante sucesso, promovidas por patrocinadores”, conta. Ele cita os casos da farmacêutica Cimed e da petrolífera britânica Shell (batizada de Shell Jovens Pilotos), que criaram suas próprias unidades.
“(A Shell) talvez tenha a sido a mais longa e de maior sucesso, que inclusive participei bastante desse projeto tanto com pilotos, como também fazendo projetos incentivados, onde eram baseados boa parte das atividades da academia”, recorda. Entre os competidores apoiados pela empresa, estão os já citados Di Mauro e Ramos.
Porém, as iniciativas encerraram as atividades. Hoje, a Cimed se retirou totalmente do automobilismo e a Shell atua como patrocinadora de competidores selecionados.
Nada que impeça o retorno dessas iniciativas por nossas terras.
Academia de Pilotos CBA
Em maio do ano passado, mais precisamente no dia 13, foi a vez da Confederação Brasileira de Automobilismo fazer um anúncio: a criação de sua Academia de Pilotos.
Na ocasião, o presidente da entidade, Giovanni Guerra, foi direto ao ponto: “Desde o início de nossa gestão, temos traçado planos e metas para fazer a Academia de Pilotos CBA acontecer e conseguimos iniciar o projeto em definitivo com essa premiação especial para o Mundial e Copa do Mundo de Kart, além do projeto escola da Fórmula 4 Brasil.”
Com isso, os campeões das categorias OK FIA e OK Junior FIA da Regional Cup Brasil de Kart levam, como prêmio, a participação no Campeonato Mundial de Kart. Em uma “repescagem”, o melhor da OK FIA também tem lugar garantido na Copa do Mundo de Kart OK-N.
Além da inscrição, eles têm direito a todos os equipamentos (kart, motor, pneus, macacão e uniforme) e o auxílio de um coach com experiência na competição, para facilitar a adaptação. Em 2024, essa função foi exercida por Luiz Sérgio Ferraz dos Santos, o “Zé Bolão”.
Conforme Rubens Carcasci, presidente da Comissão Nacional de Kart (CNK) da CBA, este é apenas um dos objetivos da Academia de Pilotos CBA. “Outra meta é dar visibilidade a esses pilotos, de forma que seus resultados possam ajudar na captação de patrocinadores pessoais para darem seguimento em suas carreiras”, informa.
Só que a proposta foi além. Em vez de três, a iniciativa contemplou cinco pilotos: os campeões da Regional Cup de Kart Vinicius Ferro (OK Junior FIA) e Gabriel Koenigkan (OK FIA); além dos três melhores da Seletiva OK-N, Enzo Prando (campeão), Lucas Moura (vice) e Heitor Farias (3º lugar).



Um norte para as carreiras
Os coaches orientam os pilotos nas pistas. Papel semelhante desempenham as academias, mas com o foco naquilo que poucos competidores – ou seus familiares, quando falamos dos mais jovens – têm tempo de trabalhar: no planejamento de carreiras.
Neste sentido, surgiu a Academia Bravar SG28 Racing, comandada por Ernandes Onassis e Carlos SG. O primeiro, é CEO da equipe ONS Motorsports e da fabricante de chassis Bravar; o segundo comanda a equipe SG28 Racing, atualmente na Stock Light e na Império Endurance Brasil.
“No final de 2024, em uma conversa com Onassis, percebemos a importância de oferecer aos pilotos de kart um acompanhamento e direcionamento em suas carreiras”, conta Carlos SG. “Essa orientação é essencial não apenas para a evolução dentro do kart, mas também para prepará-los para a transição para o automobilismo de Turismo, independente da idade.”
Essa mesma percepção – de orientar ao longo da carreira – teve Fávaro. “Desde que comecei, tenho essa visão: preparar o caminho todo dos pilotos, onde eles vão se desenvolver técnica e profissionalmente”, observa. Foi assim que nasceu a M/Force Driver Development, com seus braços no kart, na Stock Light e na Turismo Nacional.
O dirigente já fazia esse trabalho enquanto gestor de carreiras na Agência MotorBiz. “Mas, nunca (foi) de forma institucionalizada como academia em si, nem com equipes definidas e geridas por nós”, complementa.
Assim como a Academia Bravar SG28 Racing, a M/Force Driver Development é uma união de fatores. Esta última, porém, decidiu por se associar a equipes já existentes, que comandam a parte técnica, enquanto Fávaro fica com a parte de gestão – pelo menos nesta primeira fase de implantação.
O mesmo pode se dizer da motivação de Carlos SG, mas de uma forma diferente. Primeiro, reconhece que ele e Onassis compartilham ideias semelhantes, embora não exatamente iguais. Depois, vêm a experiência do companheiro.
“Ele possui inúmeras horas de atividade em kartódromos e autódromos, sendo um profissional que já formou diversos pilotos de alto nível”, explica. “Essa bagagem de conhecimento e prática já diz muito sobre sua capacidade em contribuir para o desenvolvimento dos pilotos.”
Como participar
Cada academia tem suas regras. Enquanto a gerida pela CBA usa especificamente os resultados em pista, a Bravar SG28 Racing é aberta a todos, independente da idade ou categoria. A grande diferença é no investimento, que é apresentado de maneira individual, de acordo com a intenção do competidor – e sempre com ajuda e direcionamento da organização.
“Todo o suporte fornecido na pista vai incluir treinos individuais e coletivos, além de aulas de integração com a fábrica Bravar”, ressalta Carlos SG. Já para quem quiser ir para as categorias de Turismo, o ‘pacote’ contempla finais de semana de corrida da Stock Light, com interação direta no box e participação no acerto do carro e nas estratégias de equipe.
Outro ponto de destaque é em relação à gestão da carreira. “Vamos auxiliar na criação de projetos para captação de patrocínios e nas negociações com equipes de outras categorias em que a SG28 Racing não está presente”, continua. Isso porque a “missão é oferecer uma gama completa de soluções relacionadas ao automobilismo”.
Situação semelhante terá quem integrar a M/Force Driver Development. “Os pilotos precisam trazer seus patrocinadores. A gente ajuda a elaborar os planos de trabalho e de carreira, usando também a MotorBiz, mas hoje a gente tem a necessidade que os patrocinadores venham junto com os competidores”, diz Ricardo Fávaro.
Isso ocorre porque a implantação da iniciativa está sendo feita por fases. A primeira – e atual – é a de estruturação das partes técnica (associação com equipes) e conceitual (serviços oferecidos pela Agência MotorBiz). Há também a estruturação do Instituto Brasileiro do Valor Humano (IBVH), com o intuito de vender o programa para empresas.
Com mais apoiadores, Fávaro espera que os carros já tenham uma boa parte de patrocínios já no próximo ano. “(Isso) Vai, obviamente, nos permitir trazer os pilotos que a gente têm mais interesse.” Mesmo assim, a academia só tem vaga na divisão de kart atualmente.
Resultados na pista são importantes
Mas, os interessados em participar precisam ter em mente que uma academia de pilotos não é filantropia. Por mais que tenha uma missão, ela faz parte de um esporte que exige um grande investimento. Programas como esses, para oferecer o que há de melhor no desenvolvimento de competidores de alto nível, também vão buscar aqueles que mais se destacam em suas competições.
Rubens Carcasci reforça que, para entrar na Academia CBA, os pilotos precisam ter resultados alcançados na pista, principalmente na Regional Cup de Kart. No caso da iniciativa da entidade, é ele que garante o apoio financeiro e os equipamentos para as competições internacionais.
No caso da M/Force, isso será ainda mais importante quando tiverem patrocínios próprios. “Obviamente, a gente vai buscar dentro do universo quem se encaixa em cada categoria, quem estão se destacando versus quem está precisando mais”, observa Fávaro. Isso porque, para ele, uma das premissas é viabilizar as carreiras de quem precisa “e tem talento e vai corresponder”.
Tempo de permanência
“Por enquanto (os kartistas ficam) apenas o tempo desde a entrada na Academia até a disputa do Campeonato Mundial”, diz Carcasci. Com isso, aumenta-se a possibilidade de outros pilotos conquistarem a oportunidade de representar o Brasil em uma competição como o Mundial de Kart.
Já com as demais, é diferente. Tanto a Academia Bravar SG28 Racing quanto a M/Force Driver Development não estabelecem um prazo. “O piloto permanecerá conosco enquanto necessitar de apoio e continuar sua evolução”, destaca Carlos SG.
Enquanto isso Ricardo Fávaro, acredita que a tendência é os pilotos, por exemplo, que estão no kart, permaneçam na M/Force por bastante tempo. “Mas, é claro, vai depender de muitos fatores.” Entre eles, o alinhamento de expectativas entre as partes.
Atenção aos objetivos de cada academia
Por fim, é sempre importante lembrar quem quer participar de uma academia de pilotos: atenção à proposta delas. De nada adiantar buscar que uma voltada apenas para o kart o leve para categorias de Turismo; ou, então, que “abra uma brecha” para que fique mais tempo que o combinado.
Por exemplo, neste momento, já se sabe que a Academia de Pilotos CBA tem um limite de permanência, e é apenas para o Campeonato Mundial de Kart e a Copa do Mundo OK-N.
Por sua vez, a Academia Bravar SG28 Racing adota uma abordagem diferente: o foco está em direcionar a formação para as competições de carro. Por isso, haverá treinos com modelos da Stock Light e também em protótipo AJR da equipe na Império Endurance Brasil.
Na M/Force Driver Development, a ideia é semelhante. Porém, além da Stock Light, os integrantes podem ingressar na Turismo Nacional ou, se for o caso, permanecer no kart.
Por isso, é importante lembrar: definir onde se quer chegar na sua carreira é crucial. Não significa que dará certo, mas, pelo menos, o piloto terá a certeza de que se desenvolverá para chegar lá.