O que esperar das mudanças de motores no kartismo nacional
Adoção dos modelos Vortex 60cc FIA, OKN FIA e Iame X30 geraram preocupações em parte da comunidade do kart brasileiro. CNK e fornecedores destes propulsores explicam os benefícios para o desenvolvimento da modalidade no Brasil
O dia 29 de março de 2024 movimentou o kart brasileiro, mas de um jeito diferente. Pilotos, preparadores e equipes tiveram um misto de sentimentos quanto à novidade para esta temporada. Pelo menos em um primeiro momento.
Naquela terça-feira, a Comissão Nacional de Kart (CNK) da Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA) fez um grande anúncio: a troca dos motores 2 tempos para algumas categorias nas competições nacionais.
A partir desta temporada, os Vortex 60cc FIA substituem os KTT 125cc na Mini 2T, enquanto os Iame MY serão trocados pelos Iame OKNJ FIA na Júnior, TM OKN na OKN (antiga Graduado) e Master e Iame X30 na Novatos e Sênior (e suas divisões).
Além disso, o Regulamento Nacional de Kart (RNK) desta temporada não prevê o sorteio destes propulsores nas competições nacionais – com exceção das categorias OK FIA e OK Junior FIA.
De acordo com Rubens Carcasci, presidente da CNK a substituição motores mais atuais tem um propósito. “Não escolhemos esse motor porque é da FIA (Federação Internacional do Automobilismo). Estudamos e vimos que esse conceito OKN da FIA serve de modelo para o Brasil.” Ou seja, como ele mesmo diz, “não foi um ‘copia e cola’ do que está acontecendo lá fora”.
Aqui, vale um adendo: os motores OKN foram criados em 2022 e usam os OK FIA como “base”. A letra “N” é de “National” (“Nacional”, em tradução livre), com menos potência que o seu “conceito-pai”, servindo como uma espécie de “transição” para o modelo mais forte.
O por quê da mudança
Substituir os KTT 125cc e Iame MY não foram apenas “trocas”. Carcasci vê como uma atualização para o kartismo nacional. “Foram duas coisas primordiais (que motivaram a ação)”, diz. A primeira, diz respeito à equalização dos equipamentos usados aqui com os da Europa, onde muitos que desejam seguir na carreira voltam os seus olhos.
“Começamos com os pneus MG. Os que têm aqui no Brasil são os mesmos (dos) que se correm lá fora, além dos chassis (da Europa que vêm para o país)”, continua. O segundo ponto diz respeito à própria fabricação dos motores 2 tempos usados até o ano passado nas referidas categorias, com fabricação beirando a duas décadas. “Estávamos ficando muito para trás nesse quesito.”
Pier Paolo Bei, responsável pela TM Kart Brasil, concorda. Responsável por fornecer os TM OKN para algumas classes do kartismo brasileiro, lembra que os modelos mais antigos geram muita vibração, contribuindo para a quebra de chassis. Além disso, são mais usados no Brasil, na Argentina e alguns outros países – enquanto o resto do mundo já está com propulsores mais atualizados.
Entre essas novidades dos motores deste ano, está na maior estabilidade durante as competições. Samuel Mittag, engenheiro mecânico que comanda a Mittag Preparação de Motores, explica: “Ele tem um balanceador no virabrequim, onde a vibração do kart diminui bastante”.
Em resumo, o custo pode até ser maior, mas os benefícios também são. Afinal, quem é que gosta de consertar ou trocar chassis por avarias causadas por motor?
Custo versus Benefício
Quanto ao custo, Bei, Carcasci e Mittag são enfáticos: os novos motores 2 tempos são, sim, mais caros que os anteriores. “Em termos de valor, (o Iame X30) é o dobro que um MY”, afirma Mittag. Entretanto, a diferença para por aí. “A manutenção é a mesma, e as peças são quase todas as mesmas”, conta.
Já o representante da TM Kart Brasil ressalta que, “embora (os OKN) tenham um custo maior, a durabilidade também é maior”. Muito devido à já mencionada menor vibração que, além de não danificar os chassis, deve ter exigir menos manutenção. “Principalmente por causa da biela, que é o maior custo. Ele também é um motor feito para competição, então os riscos de quebra são muito menores”, argumenta.
Carcasci resume: “A tecnologia vai melhorando, os equipamentos ficam melhores e mais duráveis.” Por exemplo, os OKN têm uma limitação de giro, de no máximo 15 mil rotações por minuto (RPM). Já os X30 chegam até os 16 mil (RPM).
Se, por um lado, isso pode significar uma sensação de velocidade menor, o resultado final pode ser bem diferente.
Novos motores, mais competitividade
Tanto Bei quanto Mittag acreditam que esses propulsores contribuirão para a competitividade nos campeonatos.
No caso dos OKN, Bei aponta que a velocidade média é maior que os MY. Outro fator que deve contribuir é quanto à expertise de preparadores. Por ser mais novo e com pouco tempo de uso no Brasil, haverá mais “trabalho” para encontrar o acerto ideal.
Já no caso dos X30, Mittag vê essa menor velocidade como positiva. “Em um grid de 30 pilotos, o tempo do primeiro para o último é muito mais perto do que como se fosse um MY”. Segundo ele, o modelo deste ano tem mais torque, permitindo uma arrancada mais eficiente, ajudando quem erra mais nas retomadas ou é mais pesado.
Fim dos sorteios
De todas as categorias com motores 2 tempos, apenas as OK FIA e OK Junior FIA terão sorteio de motores nas competições nacionais. Rubens Carcasci, presidente da CNK, lembra que isso já é comum nestes campeonatos, nos quais os pilotos já competem com motores próprios.
Por isso, determinar que certames promovidos ou supervisionados pela CBA – como a Copa Brasil de Kart ou o Campeonato Brasileiro de Kart – não tenham mais sorteio já era esperado.
Ao mesmo tempo, elenca outros dois pontos positivos nesta regra.
O primeiro é em relação ao custo. “O que os pilotos gastam com aluguel de motores, podem investir em um motor”, acredita. Para ele, dessa forma, o “investimento será pago” em pouco tempo, e os kartistas terão um Vortex 60cc FIA, OKNJ FIA, OKN FIA ou Iame X30 só seu.
O segundo ponto, talvez o mais importante, se trata do desenvolvimento dos próprios competidores. “A gente também tem que dar a possibilidade do piloto dessas categorias se desenvolverem, entenderem mais sobre o equipamento e sobre os motores.” Enfim, permitir que ponham “mão na graxa”.
E como está a adesão?
Carcasci afirma que a adesão aos novos motores, principalmente os OKN, está positiva. “A procura para a compra está boa”, avalia o presidente da CNK. “Eles ainda não chegaram, mas os pilotos estão interessados”, adiciona.
Para Bei, da TM Kart Brasil, isso se deve à aproximação dos campeonatos nacionais do Brasil com os de outros países, principalmente do Velho Continente. Com isso, espera que os nossos pilotos possam se desenvolver aqui.
“Se pegarmos como exemplo o (Felipe) Drugovich e o (Gabriel) Bortoleto, começaram a correr aqui, mas foram novos correr lá fora. Mas não é todo mundo que tem essas condições”, reconhece.
Por isso, mesmo com esse interesse, Carcasci mantém os pés no chão em relação às expectativas. O dirigente do kart brasileiro prefere não falar em números. “Temos a expectativa de que a mudança seja gradual, que aconteça aos poucos”, salienta.
Dessa forma, se a CBA conseguir igualar o grid das extintas Graduados e Júnior nas OKN e OKN Júnior, já considerarão como estar no caminho certo.